Meu avô sempre foi um desses avôs
exemplares. Quando criança, eu adorava ir pra casa dele e ficar
jogando baralho por horas e horas. Foi ele que me ensinou a jogar
Escopa, até hoje um dos meus jogos de cartas prediletos. Era sempre
assim, de noite íamos pra cama dele, enquanto minha vó assistia
televisão na sala, e jogávamos Escopa, ou Memória, ao som do
futebol no rádio. Meu vô é americano, mas sempre apoiou os netos
na torcida pelo galo. Depois do final de qualquer jogo do atlético, meu
primo sempre ligava pro meu avô, e lembro de ouvir atentamente ao
debate sobre o jogo que tinha acabado de acontecer. Talvez isso
explique a minha paixão atual por futebol...
Mas dentre as muitas coisas boas da infância na casa do meu avô – como a coleção de tampinhas, o futebol de botão, a coleção de carrinhos e a pelada com os primos no quintal – a que mais se destacava era a preparação pro Natal. Era sem dúvida a época mais empolgante da minha infância, já que eu auxiliava meus avós com todos os preparativos. Com a minha avó eu decorava a árvore e com meu avô eu montava o presépio – um presépio lindo e enorme, cuja construção sempre rendia bons papos acompanhados de enormes aprendizados de todos os tipos. Mas o que não dá mesmo pra esquecer é do carinho com o qual ele sempre tratou seus filhos e netos. Ainda me encho de alegria ao lembrar da sua recepção sempre amorosa quando eu chegava em sua casa, com um beijo na testa e um sonoro “ôôô netinha querida do vô”. Houve épocas em que eu tinha, inclusive, o título de neta predileta – agora o divido com outras duas lindezas.
Enfim, no meio dessa infância ótima passada em grande parte em companhia do meu avô, sempre ouvia dizer que ele era poeta. Pra mim ele era simplesmente meu avô e, de todo jeito, eu sempre fui mais de prosa do que de poesia. Já depois dos 18 anos, no entanto, uma curiosidade pela obra dele coincidiu com o lançamento de sua poesia reunida “Homem ao Termo”. Abri então o meu exemplar e comecei a entender porque é que sempre elogiavam tanto meu avô. Li de cabo a rabo e fiquei totalmente impressionada com a qualidade de sua poesia – não porque eu entendesse alguma coisa do assunto, mas justamente porque eu nunca tinha me interessado por poesia e mesmo assim a sua conseguiu me atingir com sua crítica finíssima, com sua ironia mais do que sofisticada, e com sua habilidade fora do normal com as palavras. Foi aí que redescobri meu avô como mais do que um avô sensacional, mas como um dos mais reconhecidos poetas de vanguarda do país, esse Affonso Ávila sobre o qual todo mundo falava e que agora eu conseguia entender o porquê.
Agora esse super avô e super poeta está no hospital e infelizmente a distância me impede de ir visitá-lo, mas queria deixar aqui o meu desejo de rápidas melhoras e junto a isso o mais sincero agradecimento por todo o seu amor e por todos seus ensinamentos e minha profunda admiração por sua inteligência e sua obra. Afinal de contas, eu não poderia jamais escrever um discurso da difamação do poeta. Definitivamente não desse.
Nossa, Nat, que texto lindo e sensível. Encheu meus olhos de lágrima e meu coração de conforto poucas horas depois de deixar o hospital e ficar com o poeta/pai/avô e agora bisavô, veja você, da mais nova Laís, a de Oliveira Todaro. SAUDADES!!!!!!!!!!!!!! Tia Inha
ResponderExcluir