Sheik volta atrás, Nanda continua depilada

Depois da polêmica que Nanda Costa causou por posar nua “sem estar depilada”, estando, no entanto, indubitavelmente depilada, mais um banho de machismo, homofobia e conservadorismo: o jogador Emerson Sheik, após o corajoso (infelizmente esse adjetivo ainda faz sentido nesse contexto) selinho no amigo, se “desculpa” por ter “ofendido os corinthianos” e termina com uma piadinha homofóbica, pra que ninguém duvide de sua macheza.

A declaração foi precisamente esta: "Lamento se ofendi a torcida do Corinthians, não foi a minha intenção. Foi só uma brincadeira com um amigo, até porque eu não sou são-paulino" (leia a notícia aqui).

Esses dois casos me chamaram particularmente a atenção por conseguirem expor o nível completamente absurdo (para não dizer surreal) de machismo, homofobia e intolerância da nossa sociedade. No primeiro, temos uma mulher que, mesmo estando depilada, causa polêmica por não estar. Sintoma de uma sociedade que impõe tantos procedimentos estéticos sobre as mulheres, que as pessoas nem reconhecem mais um corpo sem tais intervenções (ou melhor, os homens, porque as mulheres que passam por todos esses procedimentos sabem muito bem como é seu corpo natural – a menos que já nem se lembrem mais). Para os desavisados, conto que os pelos pubianos não nascem assim, nesse formado quadradinho, e a única forma de deixá-los assim é através da depilação. O fato das pessoas acharem inaceitável uma mulher apenas um pouco (pouco?) depilada e o fato de não conseguirem apreciar a beleza de uma mulher sem intervenções impostas e dolorosas, mostra que o machismo está mais em cena do que nunca: vão vigiar até as nossas bucetas. E vão nos discriminar se elas não seguirem seus padrões.

Do outro lado, temos um homem, jogador de futebol, que 'ousa' comemorar uma vitória com um selinho em seu amigo (ou amante, ou namorado, ou marido – não deveria nos importar qual a relação que ele tem com esse sujeito). Inicialmente ele dá declarações interessantes, diz que “tem que ser muito valente para celebrar a amizade sem medo do que os preconceituosos vão dizer”, mas depois da enorme revolta de grande parte da torcida, volta atrás, chega ao absurdo de pedir desculpas e ainda solta a piada homofóbica, que é para a ordem ser definitivamente reinstaurada. E quando as pessoas se REVOLTAM com um SELINHO que uma pessoa deu em outra, que nem sequer era um ato de assunção da bi/homossexualidade e que deveria dizer respeito a ele e a ninguém mais, é porque a situação é muito séria. E quando a pressão externa o leva ao absurdo de pedir desculpas por isso, a situação é muito pior.

É curioso ainda observar que a brincadeira do Sheik (termo que ele próprio usa) é completamente intolerada, ao passo que as piadas e brincadeiras homofóbicas (e machistas, racistas, classistas) são amplamente aceitas e quem as questiona é taxado de ditador, censor, opositor da liberdade de expressão. Dois pesos, duas medidas. É porque falar o que quiser tudo bem, mas beijar quem você quiser já é vandalismo.

Mas é isso aí. Ingenuidade minha achar que só as mulheres não depiladas sofreriam discriminação por não estarem depiladas e que só homossexuais sofreriam com a homofobia. Mas, pensando melhor, não sei o porquê do meu espanto, eu sempre soube que essas intolerâncias não tinham lógica alguma.