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Uma parte de nós se foi com o Museu Nacional, e agora?

Sou uma sonhadora incorrigível. Essa noite, no entanto, habitaram meus sonhos imagens de fogo e destruição. Fiquei profundamente abalada com o incêndio do Museu Nacional, esse lugar tão especial por diversos motivos.  Um lugar que continha um patrimônio histórico incalculável, tanto para o país quanto para a humanidade. Um lugar que além de cuidar do passado, era palco de uma atual e efervescente produção de conhecimento, uma vez que abrigava diversos programas de pós-graduação da UFRJ.  Como Antropóloga que sou, ver queimar a casa de um dos mais renomados programas de pós-graduação em Antropologia do país, casa também de muitas pessoas queridas que passaram ali anos desenvolvendo seus mestrados e doutorados, me parte o coração. Me parte o coração também em um lugar muito pessoal, pois grande parte da minha relação com minha cidade do coração, o Rio de Janeiro, passa pelo Museu Nacional, de onde guardo bonitas memórias das atividades acadêmicas pontuais que vivenciei lá.
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A feminização do desequilíbrio - ou por que homens não fazem terapia?

Começo dizendo que sei que, apesar de não ser um número expressivo, há homens que fazem alguma espécie de terapia, mas meu ponto com esse texto é que a proporção de mulheres que buscam essa ajuda para lidar com suas questões psicológicas e emocionais é absurdamente maior. Vejo com frequência homens em sofrimento muito resistentes a entrar em algum tipo de tratamento terapêutico, como se eles fossem bons demais pra isso, como se não precisassem de ajuda em nada, como se isso fosse coisa de gente doida, ou pior, como se fosse "coisa de mulher".  Fico pensando que essa idéia culturalmente enraizada da mulher histérica, emocionalmente desequilibrada, em contraste com a do homem forte e independente contribui muito pra essa resistência masculina, mesmo nos meios mais "descolados" e pretensamente desconstruídos. E aí fico pensando o impacto que essa ausência de investimento em auto-conhecimento e auto-transformação por parte dos homens tem na nossa sociedade: como

Precisamos falar sobre sexo

Pode-se pensar a princípio que já falamos demais sobre isso. Realmente, na internet, na televisão, nas mesas de bar, muito se fala sobre um certo ideal de sexo. Mas sobre o que da fato acontece na vida real fala-se muito pouco. Muitas vezes o próprio casal (seja fixo ou eventual) não consegue conversar sobre o que foi bom, o que não foi, o que e como melhorar.  E foi esse vídeo aqui  que me motivou a escrever sobre isso, porque têm coisas muito sérias acontecendo por aí sendo chamadas de sexo. E isso é uma questão que diz respeito a todo mundo, mulheres, homens e trans seja de que orientação sexual forem.  Eu particularmente estou mais familiarizada com a dificuldade que as mulheres heterossexuais têm de se colocar, de parar quando tá ruim, de dizer o que gostam e o que não gostam, de sentir prazer e de se empoderarem pra sair da posição de objeto ou de benfeitoras (que priorizam o prazer do parceiro em detrimento do seu próprio). Falo então desse lugar, sem que isso signi

Intimidade e DST: pelo direito de não transar

*Esse é um texto direcionado principalmente às mulheres bi ou heterossexuais Acho que está na hora de conversarmos seriamente sobre DST e intimidade.  Tenho pensado como a luta (importantíssima) pela liberdade sexual feminina e suas conquistas trouxe consequências com as quais temos que lidar, porque tudo nessa vida tem prós e contras. Um desses contras é quanto estamos expostas a doenças sexualmente transmissíveis (das mais leves às mais sérias). O outro desses contras é o quanto muitas vezes nos sentimos obrigadas, às vezes inconscientemente, a fazer um uso intenso e indiscriminado dessa liberdade e acabamos transando com gente nada a ver (e, de novo, nos expondo a riscos). Poder transar no primeiro encontro sem ninguém julgando ou enchendo o saco é uma conquista feminista importante, afinal de contas, nosso corpo, nossa vida, nossas regras. Mas essa liberdade não é só feminista, muitas vezes ela vira nossa inimiga. Exemplifico: uma vez, há muitos anos atrás, fiquei c

Ser feminista e conviver bem com homens. É possível?

Antes de qualquer coisa, faço a ressalva de que estou escrevendo para mulheres (portanto, se você for homem, peço que nos dê uma licencinha). Começo esse texto já fornecendo uma resposta muito pessoal para a pergunta do título: sim, é possível. Não pretendo dar aqui uma receita, pois cada uma vai achar sua forma de ser fiel ao seus princípios e continuar lidando bem com pessoas queridas que calharam de ser homens e que, às vezes, vão sim dar aquela escorregada machista. Mas vou compartilhar aqui o meu processo por imaginar que esse relato possa auxiliar as manas que estão passando por esse conflito (que é sim muito grande e sério). Sou feminista há mais de uma década, desde quando ninguém usava essa palavra sem fazer uma cara de nojo. Foi muito, muito difícil ser a pessoa que saía da mesa e brigava com os amigos/parentes quando rolava aquela piadinha machista/racista na época em que quase ninguém problematizava isso. Há cerca de uns cinco anos essa situação começou a mudar e é

Da política ao auto-conhecimento - ou porque auto-cuidado não é alienação

  "Frei", do alemão, "livre". (Foto minha de uma placa em Berlim) Este texto é um desabafo, uma terapia e uma forma de engajamento político ao mesmo tempo. Ele é fruto de uma angústia cuja razão demorei um tempinho pra entender. Pra lidar com esse sentimento estranho que eu não conseguia significar, resolvi seguir o conselho que sempre dou para as pessoas: depois de aceitar e sentir, procurei entender o que esse sentimento estava querendo me dizer. Nesse processo de auto-análise percebi que há muito tempo eu não escrevia no blog - coisa que amo - e consegui descobrir a razão: me afastei, por motivos que vou explicar ao longo desse texto, do ativismo político - na sua concepção clássica, ao menos - e como o blog sempre foi destinado à política, eu não tinha mais o que escrever no blog. Não que eu não tenha mais nada pra dizer, tenho muita coisa, mas por receio do julgamento externo, acabei me silenciando. Explico.  Cresci em um meio intelectual, majorita

Mulheres na frente e atrás das câmeras: Como vai você, Olívia?

“Finalmente um filme que fala de maternidade sob uma perspectiva feminista” foi o primeiro pensamento que me veio à cabeça quando terminei de ver o incrível “Olmo e a Gaivota”. E não por acaso a ficção documental, que mostra o ponto de vista de uma atriz de teatro durante sua gravidez real, foi dirigida por duas mulheres, a brasileira Petra Costa e a dinamarquesa Lea Glob. A forma através da qual as diretoras misturam ficção e realidade faz com que o filme seja muito mais do que a discussão sobre um tema importante: ele é propriamente uma obra de arte. Como é bom – e raro – assistir a filmes de mulheres! Racionalidade à parte, os sentimentos que me vieram foram vários: fiquei profundamente tocada com esse filme, que conversou diretamente com minhas muitas questões em torno da maternidade (uma realidade ainda ausente da minha vida, mas que se mostra cada vez mais próxima e possível). Não sei se quero ser mãe. Sei que agora não quero – apesar de que sei também que não interr